Há semanas, o noticiário e as conversas de botequim
têm se limitado à curiosidade sobre o futuro de Lula e do próprio Brasil. Não imaginemos que o julgamento do habeas corpus na última quarta-feira encerrou a novela ou decidiu alguma coisa. Longe disso. O julgamento se limitou a decidir se o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao negar ao pedido da defesa de Lula, o fez de forma ilegal ou abusiva. O Supremo Tribunal Federal (STF) não decidiu nada quanto à cláusula constitucional da presunção de inocência. Afinal, pode prender alguém depois de julgado pela segunda instância ou só depois de transitar em julgado a sentença penal condenatória?
Ninguém sabe porque não foi decidido. Há enorme possibilidade que, quando o STF julgar as duas ações que examinarão a constitucionalidade dessas prisões decidam pela inconstitucionalidade. Depende, em princípio, de como votará a ministra Rosa Weber, pelo menos. Se optar pelo voto que acompanha a jurisprudência do STF desde 2016, a votação terminará como o foi no habeas julgado quarta passada. Entretanto, se optar em julgar de acordo com o que pensa sobre a matéria, inverte-se o resultado. Até lá, não tem nada decidido e a eventual prisão do ex-presidente pode sofrer um revés. Ao lado de tudo isso, vários recursos ainda poderão ser impetrados: ou para livrá-lo da cadeia, ou para fazer cessar a prisão se já estiver cumprindo a pena antecipadamente. Todos os recursos terminarão no STF cuja tendência ainda é desconhecida.
Portanto, é aventura jurídica afirmar que a novela se encerrou e Lula está definitivamente condenado. Como é temerário afirmar que não poderá ser candidato por força da lei das inexigibilidades porque condenado por colegiado. E se o STF validar o conceito de que ninguém poderá ser considerado culpado, senão depois do trânsito em julgado? Não poderá, nesse caso, alguém sofrer um efeito sancionador sendo inocente. Dirá alguém que essa lei tem efeitos apenas eleitorais. Entretanto, a Carta Política de 1988 não fez essa distinção e, por coerência, não só a prisão antecipada será inconstitucional, se essa for a conclusão, como também o dispositivo do art. 1º inciso I, letra "e" da lei complementar nº 135, de 4 de junho de 2010 que trata dos condenados por órgão judicial colegiado (TRF4, por exemplo). Nesse caso, só não pode concorrer alguém condenado com o trânsito em julgado porque, antes disso, é inocente e não pode ser castigado nem prejudicado, o que é reservado para alguém que tenha culpa reconhecida definitivamente. Tudo ainda vai depender do que está pensando o STF hoje, porque amanhã, dependendo do cenário ou dos personagens, poderá alterar seu posicionamento ou, como se diz em direito, alterar a jurisprudência.